Digitalização pode impulsionar desenvolvimento social e democracia
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A democracia e o digital
Democracia e o digital. Logo após a queda do muro de Berlim, o império soviético começou a ruir literalmente pela bordas. Foram as nações periféricas do norte, à beira do mar Báltico, que iniciaram seus processos pacíficos de independência; não houve guerra principalmente porque a Rússia garantiu um enclave de saída para o mar. O processo de dissolução começou ainda nos anos de 1990, com a Lituânia.
A pergunta que o mundo fez à época foi: como os pequenos países Bálticos (Lituânia, Estônia e Letônia) poderiam sobreviver e prosperar socialmente sem a ajuda da grande matriarca “mãe Rússia”? No fundo, a busca de identidade e independência não eram novidades para esses países, pois alguns já fizeram parte da Finlândia anteriormente. A saída para o Báltico (pesca), a abundância em âmbar (resina vegetal), as reservas de madeira e o turismo foram a solução para algumas dessas nações.
Mas a pequenina Estônia ambicionou algo muito maior; queria deixa para trás toda a burocracia e atraso soviéticos e investir em tecnologia. Afinal, após entrar na União Europeia, como fazer jus à competição econômica de França e Alemanha, por exemplo?
No ano de 2000 não havia sequer internet no país. Hoje, a Estônia se tornou a mais próspera das três nações Bálticas, exportando algo inusitado até então: seu próprio governo. Ocupa a 29a posição entre no ranking de IDH (índice de Desenvolvimento Humano) das Nações Unidas e tem a média de desemprego mais baixa do bloco europeu. Seu investimento em tecnologia teve endereço certo: combate à burocracia, corrupção e desenvolvimento na educação.
Estônia: uma guinada digital
Hoje a Estônia é conhecida por ser a única república 100 por cento digital. É possível se fazer quase todo o serviço público pela internet: venda de imóveis, levantamento de certidões, autenticação de documentos, alteração de dados, pagamentos e, inclusive, votar e exercer outros direitos. Cada cidadão é dono de uma série numeral única que dá acesso a todo o sistema; o único trâmite que ainda é necessário a presença física é o casamento, ou divórcio. Para se ter uma ideia na agilizada do governo digital, uma empresa pode ser aberta em 15 minutos pela internet.
Para a história da Estônia, a digitalização se transformou em sinônimo de segurança, equidade e transparência. Mas como isso é possível, se hoje tendemos a relacionar o digital a fraudes no Brasil? O sistema que a Estônia mais investe no momento chama-se Blockchain, justamente aquele que é utilizado para registrar os trâmites das chamadas moedas digitais, como o Bitcoin. O nome é complicado, mas trata-se de uma tecnologia digital praticamente infraudável, que veio para ficar.
Para compreender, a tradução do nome já diz muito: “Block” (bloco), “Chain” (cadeia). Quando usamos o Blockchain a informação (uma transação bancária, por exemplo) é criptografada (codificada) em uma chave e desintegrada em milhares de servidores pelo mundo, como pequenas peças de um quebra-cabeça. Quando o destinatário recebe a informação (a chave), todo quebra-cabeça é remontado como um bloco único, e então decodificado. Mesmo que um fraudador tenha acesso a uma dessas peças, é impossível obter o quebra-cabeça inteiro. O sistema I-voting (voto eletrônico) da Estônia não usa sequer urnas eletrônicas. O voto é feito pela internet, por meio de um sistema de Blockchain.
Como contrapartida ética, a educação não ficou de fora. A rede de escolas cem por cento pública abraçam desde a independência, como princípio, todas as origens de família. A Estônia conta com um currículo mínimo composto por seis eixos; um deles corresponde à educação midiática e cidadania digital, que começa a ser explorado ainda na educação infantil. E a lição mais importante: o aprender deve ser para a vida toda.
O exemplo da Estônia prova que saber como investir é o ponto crítico de uma nação; há políticas que miram a sociedade, outras pequenos grupos. É comum pensar que o aplicativo de comunicação Skype, hoje vendido pela Microsoft, foi criado no Estados Unidos. Compreender profundamente a boa gestão pública da Estônia passa por saber como e porque o Skype foi criado justamente nesse pequeno país báltico em 2003, por três cientistas locais.